Imagem retirada do filme José e Pilar (2010), de Miguel Gonçalves Mendes.
A propósito da celebração dos 15 anos da entrega do Prémio Nobel da Literatura a José Saramago, relembramos aqui duas passagens dos Cadernos de Lanzarote em que o autor fala sobre dicionários:
“Não me lembro, desde que ando neste ofício, de ter dado tanto uso aos dicionários. E não é porque as dúvidas, agora, sejam mais frequentes ou mais incómodas que antes: o que sucede é que se vem tornando exigentíssima a necessidade de estar perto das minhas palavras.”
José Saramago, Cadernos de Lanzarote, Diário III, Lisboa: Círculo de Leitores, 1998, pp. 32-33.
“É justa a alegria dos lexicólogos e dos editores quando, ao som dos tambores e das trombetas da publicidade, aparecem a anunciar-nos a entrada de uns quantos milhares de palavras novas nos seus dicionários. Com o andar do tempo, a língua foi perdendo e ganhando, tornou-se, em cada dia que passou, simultaneamente mais rica e mais pobre: as palavras velhas, cansadas, fora de uso, resistiram mal à agitação frenética das palavras recém-chegadas, e acabaram por cair numa espécie de limbo onde ficam à espera da morte definitiva ou, na melhor hipótese, do toque da varinha mágica de um erudito obsessivo ou de um curioso ocasional, que lhe darão ainda um lampejo breve de vida, um suplemento de precária existência, uma derradeira esperança. O dicionário, imagem ordenada do mundo, constrói-se e desenvolve-se sobre palavras que viveram uma vida plena, que depois envelheceram e definharam, primeiro geradas, depois geradoras, como o foram os homens e as mulheres que as fizeram e de que iriam ser, por sua vez, e ao mesmo tempo, senhores e servos.”
José Saramago, Cadernos de Lanzarote, Diário V, 4.ª ed., Lisboa: Caminho, 1998, p. 35.
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